segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Histórias Curtas II - Lições (1)






Precisava ir aos Olivais. A noite, o frio, a chuva e o vento desconvidavam, mas tinha que ser. Bem agasalhada, toca a esperar o comboio.

Uma senhora, bem idosa, também aguarda na estação gelada. Sentada a meu lado no banco, olha-me de lado, desconfiada. Aceno a cabeça num cumprimento, e sorrio. Olha-me com os olhos opacos da velhice, cabelos brancos, um tanto gorducha, toda encolhida nos seus inúmeros agasalhos. Não retribui o cumprimento.

A espera, já normal para mim, a deixa impaciente, notava-se bem.

Vencida pela demora, ela pergunta-me: "vócê sabe a que horas passa o comboio de Alcântara Terra?" - articula a boca desdentada. Sim, minha senhora, já está a vir, veja, lá vem. Mostro as luzes da composição fazendo a curva a uns cem metros de distância.

"Parece impossível, esses brasileiros já estão até aqui? Por isso é que meu filho está em França, vócês vêm aqui p'rá ficar com nosso trabalho, fazer aumentar a renda das casas, e as mulheres vêm tomar os maridos das outras, todas *!"~#~*#~#*...". O olhar ausente transmuta-se em ódio. Lépida, levanta-se, com o chapéu-de-chuva na mão, e numa agilidade inimaginada para a idade e o peso, salta para dentro do comboio...
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